Um estágio no Japão – Kenshu
Foi durante o último governo militar que recebi a notícia que havia sido escolhido para fazer um estágio na província de Wakayama – Japão.
Na época, em 1984, o Brasil era um País fechado, as importações eram proibidas, vivíamos um processo de redemocratização, mas a economia estava em frangalhos. E eu, um engenheiro recém formado, acabara de ganhar uma oportunidade de conhecer outro País e estudar novas tecnologias.
Esta fantástica experiência me permitiu conhecer com profundidade um País de primeiro mundo, encontrar parentes que, por causa da II guerra mundial, ficaram separados da parte da família que migrou para o Brasil e aprender novas técnicas e métodos de engenharia.
Para muitos, São Paulo sempre foi a grande referência internacional no Brasil, mas na época, não contava sequer com um aeroporto internacional. Viajar para fora do País, só pelo Galeão no Rio de Janeiro.
Naquele ano, o grupo de estagiários de Wakayama ken era composto por seis membros: quatro brasileiros (duas moças e dois rapazes), um paraguaio e uma argentina. Nos encontramos no Galeão e partimos rumo ao Japão. Era o mês de junho de 1984.
Ao chegar em Tokyo, fomos recebidos pelo pessoal do Wakayama kencho, que nos acompanhou até um hotel na cidade de Wakayama, onde o grupo permaneceu por 1 semana com a finalidade de adaptação à vida japonesa, em pleno verão japonês.
Em poucos dias tivemos que aprender a sobreviver num país desconhecido. Fomos muito bem acolhidos, mas na época o acesso a computadores era muito restrito e a internet e o telefone celular não existiam, o que tornava um sofrimento a busca por coisas simples, como um barbeiro, lavanderia, e até lugares para se divertir.
Passado este período, cada qual foi para seu destino. Eu fui para a Noritsu Koki, uma fabricante de máquinas de revelação de fotografia em 1 hora.
Atualmente revelar foto é coisa do passado, embora eu ainda use o serviço. Mas na época, revelar um filme em 1 hora era novidade. Antes dessa tecnologia, o filme era revelado em grandes laboratórios, que demorava dias para realizar o serviço.
Na Noritsu eu me juntei ao KOKUSAI KA, que era um tipo de departamento internacional dentro da empresa. Eu tinha muita dificuldade com o idioma japonês no início, e o pessoal desse grupo me ajudou muito com o idioma. O estágio de aproximadamente 1 ano permitiu conhecer vários departamentos da empresa. Talvez não tenha primado pela organização, até porque a Noritsu passava por um momento de expansão e aumento de vendas nunca visto antes, e os estagiários não eram prioridade e funcionavam como “tapa buracos” nos departamentos.
Por outro lado, essa expansão gerou muitas oportunidades, inclusive para os kenshuseis como eu. Na realidade, as empresas japonesas como um todo estavam em franca expansão pelo mundo. Os produtos eram bem aceitos pelo mercado mundial e tinham preços bem competitivos.
A Noritsu revelou seu interesse em abrir uma filial no Brasil. No final do estágio fui convidado a ficar mais alguns anos por lá até estabelecer uma subsidiária no Brasil. Fiquei bastante lisonjeado com o convite, mas não pude aceitá-lo. Queria muito voltar para o Brasil, e não sabia quando seria possível abrir uma filial aqui, o que não me dava uma noção de tempo de permanência no Japão.
Mas, como sempre, tem muita gente de olho nas oportunidades. E, depois de alguns meses de volta ao Brasil, fui contatado por uma empresa importadora interessada em representar a Noritsu. Ainda era uma época muito restrita às importações. As empresas que tinham licença para importar tinham muitas vantagens competitivas.
Com o aceite da Noritsu, esta empresa passou a representá-la no Brasil e eu permaneci trabalhando com eles até 1990, quando houve a abertura das importações e foi possível estabelecer a filial da Noritsu no Brasil.
Fiz parte do processo de implantação da Noritsu do Brasil desde o início e permaneci nela até 1999 num cargo de direção.
Atualmente a Noritsu já não existe mais como empresa de maquinas de revelação de fotografia, mas sua trajetória foi uma história de sucesso.
Finalizando, o projeto Kempi-Kenshu foi um dos poucos que vi na vida em que todos ganham de verdade.
Ganha o estagiário; o governo japonês, que amplia seu domínio comercial; a empresa que acolhe o estagiário, que expande seus negócios por outros Países; e o governo brasileiro, que recebe uma filial de uma empresa que emprega centenas de funcionários.
Pena que o projeto já não existe mais. Mas tenho esperanças que os governos voltem a ter interesse em programas desta modalidade.
Flavio Takeda – Kenshusei de Wakayama ken de 1984.